segunda-feira, 21 de abril de 2014

009: Não é do John Hughes, mas é igualmente adorável.

Entre 1982 e 2008, ele deixou para a Arte um legado. O Rei da Sessão da Tarde dirigiu oito filmes e produziu e roteirizou aproximadamente vinte – marca expressiva que todo fã dessa figura tão talentosa gostaria que tivesse crescido ad infinitum.

Marcou-me profundamente com Clube dos Cinco, Curtindo A Vida Adoidado, Férias Frustradas, Esqueceram de Mim... mas especialmente com seu jeito tão próprio de falar para ou sobre os jovens e seu selo de qualidade que contagiou várias produções dos anos 80 e 90.

A seguir: uma breve lista com criações tão charmosas quanto as do inesquecível John Hughes.




1. Dr. Hollywood – Uma Receita de Amor (1991) 




O queridíssimo Michael J. Fox – exemplo de superação e astro da franquia De Volta Para O Futuro – interpreta um médico de cidade grande que se perde a caminho de Beverly Hills, destrói por acidente parte da propriedade de um juiz e é obrigado por este a se fixar na cidadezinha na qual se encontra até que "pague" pelo seu erro. Não demora muito para que Benjamin conheça Lou, personagem de Julie Warner (numa das cenas mais "Tirem as crianças da sala!" que vi quando menino) e passe a se envolver não somente com ela e seus ideais mas com a simplicidade da gente e do dia a dia do lugar, enquanto cumpre pena em um humilde e agitado hospital.

Longa marcante, cuja ausência nas tardes me é dolorosa. Claramente uma das bases para Carros da Pixar. Enredo super simples, entretanto bom como a soma entre arroz e feijão e que vem para nos lembrar da importância de olharmos ao nosso redor com mais calma e gentileza, sobre pararmos para sentir se a felicidade não se encontra há tempos diante de nós e na reprogramação de algumas atitudes (conosco e para com os outros), porém ainda não percebida.

Assim como Hughes foi capaz de dizer bastante nas entrelinhas em cenas que quase sempre não eram complexas, Doc Hollywood é um sinônimo de boa junção entre diversão e reflexão. 

Sempre de pé um convite à reprise.


2. Sem Licença Para Dirigir (1988) 




O saudoso Corey Haim, Corey Feldman (Goonies) e Heather Graham, juntos em uma versão um pouquinho mais jovem e atrapalhada do famoso trio liderado por Ferris Bueller.

Quem nunca fez de tudo para disfarçar uma armação e se sujou ainda mais no processo, ou não contou mentiras aos pais para aprontar umas e outras, jamais vai entender com plenitude essa ficção cheia de linhas de vida real. Já os que inventaram despesas com trabalhos de escola, a fim de conseguir um troco para vadiagens, ou tardes de estudo nas casas de amigos – só para citar dois "inocentes" exemplos – estão mais do que aptos para ver esse filme como símbolo que é das inconsequências da juventude.

O plot: rapaz que deseja ter a carteira de motorista – seu passaporte para impressionar A Garota – faz pouco caso de estudar para as provas. Vai mal e diz a todos que passou nos exames, e isto enche seus pais de orgulho, mas logo que seu fracasso é descoberto ele é proibido de dirigir. Movido pelo forte desejo de conquistar sua musa, a certeza de que seu plano nascido errado dará certo, e acobertado pela companhia de seu melhor e louco amigo, o "herói" Les Anderson embarca em uma aventura louca e apronta altas confusões que até mesmo o narrador da Globo jamais pensou que pudessem existir.

A semelhança com a obra mais popular de Hughes é tanta que até a figura da irmã responsável aparece no filme. E há um bonus fantástico: como instrutor de direção, ninguém mais e ninguém menos que James Avery, o TIO PHIL.

Vale citar que o desfecho é hilário, uma joia. 

Obra tão absurda quanto deliciosa.


3. O Primeiro Ano do Resto de Nossas Vidas (1985) 




Ou St. Elmo's Fire, se preferir.

Enquanto Clube dos Cinco abordou a complexidade de ser jovem em tempos de colégio e as relações entre grupos muito separados porém repletos de semelhanças (nas dúvidas existenciais, nas pressões sociais que os afligem, nas dificuldades da autoafirmação...), o filme de Joel Schumacher versa sobre quando amizades que surgiram do quase impossível se mantém duradouras em meio a turbulências, e cria no ambiente do pós-faculdade um meio de também discutir transição e amadurecimento.

Uma das mais famosas produções Brat Pack, estrelada por Demi Moore, Judd Nelson, Emilio Estevez, Ally Sheedy (), Rob Lowe, Andrew McCarthy e Mare Winningham... com proporções à la Friends, mas sem a permanente leveza do Humor ou a duração de uma série (o que, de certo modo, até explica os descuidos narrativos), contando com Andie MacDowell como coadjuvante.

Não só por ter boa parte do elenco de The Breakfast Club (o que faz parecer uma sequência, às vezes), o mesmo ano de lançamento deste ou evitar maquiar as dores ou o fervor juvenis em meio a curvas sinuosas como, por exemplo, o uso de drogas, o filme é interessante pela sua maneira franca de abordar e apresentar seus personagens e como cada um deles se compreende e enxerga os demais nessa grande relação fraternal. Pessoas que se amam e que às vezes se odeiam e se ferem de tanto se amarem.

A fotografia parcialmente nublada remete àquele momento da vida em que continuamos a dormir (fugir, evitar, procrastinar a realidade) mas somos impulsionados a logo despertarmos da nostalgia e a abrirmos mão de uma porção de sonhos. A trilha sonora é quase inteiramente montada sobre uma base de sax – instrumento cultuado por um dos garotos mais perdidos da trama – criando uma energia ainda maior de ligação entre os protagonistas. 

Geralmente não são do meu apreço as "traduções" propostas por títulos nacionais, mas "O Primeiro Ano do Resto de Nossas Vidas" transmite com precisão o espírito, em especial quando se encerra o conto e começam os créditos finais.

Bem bonito.


4. Te Pego Lá Fora (1987)




Vida escolar é uma expressão que junta diversos elementos, há tempos: descoberta, paixões, amizades, rivalidades, (ir)responsabilidade... e a terrível tortura que hoje em dia foi batizada, registrada e já atende pelo nome de Bullying.

Jerry Mitchell (Casey Siemaszko – Conta Comigo) é um daqueles tipos corretos que estudam e participam das atividades colegiais com afinco. O aluno exemplar, digno de confiança do corpo docente e da direção, que não se importa de sempre ficar à disposição e considera trabalho extra uma forma de lazer. Mas um dia surge o novato mais perigoso do século, o perturbado extreme Buddy Revell (Richard Tyson), e Mitchell começa a viver o pior dos seus pesadelos, sobretudo quando é obrigado a encarar o Jim Morrison do mal às três da tarde, no pátio do colégio, por causa de um ligeiro deslize que cometeu e mexeu com a sensibilidade do brutamontes. 

O que você fez quando sentiu que podia estar diante do fim? Sentiu que sua vida até ali tinha valido a pena, que suas decisões foram mais baseadas no seu bem estar do que em seguir todas as normas (por mais alienantes que fossem)? O filme debate essas e outras questões (como a castração da personalidade) enquanto nos mostra Mitchell indeciso entre achar uma fuga ou se tornar O Jerry, agindo sob as influências negativa e positiva do desespero. 

Sutilezas discursivas e surpresas narrativas bem-vindas. E é clichê se eu declaro "Clássico!". Mais uma vez: clássico!


5. Namorada de Aluguel (1987) 




Ronald Miller é outro garoto típico de filmes teen:  aquele que presta serviços remunerados para vizinhos e vive preso na ala dos rejeitados; enquanto Cindy Mancini é a popular, líder de torcida, "vitoriosa", namorada de um dos tantos winners idolatrados pelo modelo meritocrático americano. Certo dia a vida dos dois se liga por acaso, por um incidente, e Ronald fica na vantagem e faz Cindy recompensá-lo fingindo para todos que os dois formam um casal.

As divisões sem sentido das pessoas em grupos inúteis, novamente, mas refletindo sobre preconceitos e como tantos são capazes de renegar as origens e mudar totalmente quando se sentem por cima.

Patrick Dempsey, mega simpático e já aquecendo para o galã que em breve viria a ser, e Amanda Peterson dão formas e fôlego aos personagens centrais de uma produção que derrotou a ação do tempo e foi forjada cheia de preciocismo, elegância e um toque puro de romantismo.

Os beatles cantaram com leveza e ironia algo essencial e imutável: o amor não pode ser comprado.


6. O Vencedor (1979) 




Um exemplar de uma "escola" anterior a Hughes – a de Peter Yates (diretor do longa) – mas com uma candura na mesma intensidade que o artista reverenciado nesta postagem costumava apresentar nas telas.

Tesouro que me fez rir e chorar com seu jeito vibrante, travesso, poético. Roger Ebert (crítico de Cinema – R.I.P.) publicou um dos textos mais lindos a respeito, onde pontuou e elogiou a competência do filme em tratar sobre gente e vidas singelas mas não menos tocantes que as de metrópoles como Nova York e Los Angeles. 

Ganhador de estatuetas no BAFTA, no Globo de Ouro, no Oscar (melhor roteiro – feito por Steve Tesich), seu sucesso em ter participado de quase dez premiações se distancia do exagero e registra o quanto a proposta é dotada de qualidades tal qual causa fascínio e é recreativa.

Dennis Quaid e Daniel Stern mocinhos; Jackie Earle Haley quase irreconhecível; Dennis Christopher (astro principal) em performance brilhante.

Sobre os poderes que moram na determinação, na união, na sincera amizade, entre outras coisas.

Da lista, a produção mais difícil de conseguir cópia para assistir, mas o mediano esforço necessário é inteiro recompensado.

Ficam essas dicas: manter distância de sinopses, trailers, imagens; abrir suas mãos e receber. Breaking Away é um pouco mais do que genialidade e obra-prima: é um Presente.







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